sábado, 6 de agosto de 2011

O CASTELO DE ROBSON MIGUEL- MATÉRIA REVISTA RAÇA DE SET/11

O castelo de Robson POR CLAUDIA CANTO | FOTOS VLADI VICTORELLI






Um espaço repleto de informações culturais e de importantes documentos da nossa história, que vão desde o descobrimento do Brasil, até o surgimento do violão. O anfitrão, Robson Miguel é um dos mestres do instrumento no mundo





Em tempos de reis, rainhas e plebeus, descobrimos o violonista Robson Miguel e seu castelo, um espaço com 2.056 m² de área construída num pedaço da mata atlântica às voltas da nascente do Rio Ribeirão Pires. Ali, Robson costuma receber personalidades, artistas e amigos das mais diversas partes do mundo. O castelo possui divisões que nos remetem às histórias de reis, indígenas, negros, além de peças de tortura, calabouços, pelourinho, forca, roda de estiramento, labirintos, passagens secretas, túneis e um buraco negro com quase 100 metros de extensão a 30 metros abaixo da terra. Tudo é fruto de viagens e pesquisas que Robson faz como historiador. Um paraíso arquitetônico, eleito como a mais bela e exótica construção do Brasil em estilo medieval.

De família humilde, ele nasceu na antiga aldeia dos Índios Guarani, na região dos mangues de Vila Velha, em Vitória, no Espírito Santo. Sua etnia representa a maioria da população brasileira, mistura de negros e índios. Aos nove anos, Robson iniciou seus primeiros acordes, e com 12, foi classificado e entrou em uma turma avançada do Conservatório Musical, em São Caetano do Sul, no ABC Paulista. E foi exatamente nesta época, que viveu a fase mais complicada da sua infância: depois do abandono do pai, viu-se obrigado a ajudar a mãe a sustentar seus cinco irmãos. "Vendia doces, legumes, confeccionava pipas e engraxava sapatos", conta. Nesse ponto da entrevista, ele sorri, descontraído, quando relembra a época em que montou uma equipe de engraxates. Emprestava suas caixas de frutas, que ele próprio personalizava e, no final do dia, ganhava uma porcentagem do trabalho. "Era a única maneira que eu tinha para ajudar a minha mãe a sustentar meus cincos irmãos, e ainda conseguir estudar.

Sua majestade, o violão!


Buraco negro com 100 metros de extensão, é uma das atrações do castelo de Robson Miguel
Logo, as aulas no conservatório lhe possibilitaram o talento para ensinar. Dava dicas, ao mesmo tempo em que escutava os acordes de mais de cinco exigentes alunos. Foi nesta ocasião que desenvolveu o talento de tocar e narrar histórias ao mesmo tempo. "Descobri que a história do violão começou na Espanha, onde era tocado para reis e rainhas. Passei a sonhar com a ideia de ir conhecer alguns destes castelos. A grande dificuldade eram os meus recursos financeiros ínfimos. Passei 10 anos juntando dinheiro. Sofri muitas necessidades e tentações. E exatamente no dia 25 de julho de 1985 consegui realizar o meu sonho." Foi em Málaga, na Espanha. Robson se viu muito emocionado quando entrou em um castelo da região. E mal sabia ele que essa visita seria o começo de algo muito maior.

Ao todo, Robson conheceu 78 castelos e, a cada um que adentrava, a ideia de construir um castelo em homenagem ao violão se tornava mais obsessiva em sua cabeça. "Retornando ao Brasil, não tive mais dúvidas. Iria construir um castelo onde toda a história do violão seria contada, ao mesmo tempo em que ilustraria a história do meu país e das minhas origens. A saga dessa construção demorou cinco anos. Idealizei todo o projeto, acompanhei a colocação de cada tijolo, pensei nos mínimos detalhes", relembra Robson.

Da aldeia para o berço europeu


Uma vida de sucesso: galeria de prêmios, CDs, DVDs e medalhas
A bem-sucedida carreira de Robson como violonista é uma história à parte. A crítica europeia se surpreendeu ao ouvir suas apresentações, declarando que o seu conhecimento, aliado a sua criatividade, é próprio da genialidade dos grandes músicos. Em comemoração aos 500 anos da América, ele foi escolhido pelo governo Espanhol para representar o Brasil no Castelo de Córdoba.

Nesta comemoração foram reunidos os 67 melhores violonistas da atualidade. Com a oportunidade, Robson resolveu ficar um período na Espanha, divulgando a música popular brasileira e universal, com suas técnicas inovadoras. Ele é considerado o único artista capaz de tocar qualquer música, ao mesmo tempo em que narra histórias.

Em suas apresentações, é comum a plateia ir ao delírio quando ele toca o hino nacional no idioma Guarani, além de transformar os acordes do seu violão em uma autêntica escola de samba, imitando sons de cavaquinho, bumbo, cuíca, berimbau. Atualmente ele ocupa o 1º lugar no Ranking Mundial de Violonistas, reconhecimento outorgado pelo Círculo Violonístico Europeu de Madrid - a "terra do violão". Sua obra é composta por 16 DVDs, 23 videos- aulas, 27 CDs, e 22 livros publicados, com destaque para Th e Jazz In Your Hands, publicado ela editora Real Madrid da Espanha, está na galeria dos mais vendidos.

Sua esposa, a cantora e artista plástica, We e na, é uma bela índia da linhagem Tikuna. Eles se conheceram em Manaus, durante uma apresentação de Robson. "Quando nos casamos, ele não me falou que iríamos morar em um castelo. Ao chegar, tomei um susto, mas logo me adaptei, não mudei em nada meu comportamento. Para mim, não tem muita diferença. Aqui ou na Oca, sou a mesma pessoa", afirma We e na. Falando nisso, Robson - que é Mestre Cacique - desconfiava que nas redondezas do município de Ribeirão Pires, onde está localizado o seu castelo, havia um cemitério de índios e negros. E para a sua alegria, a desconfiança se tornou real. "É um legado histórico, através de várias pesquisas arqueológicas, chegamos ao cemitério", orgulha-se. No dia desta entrevista, nossa equipe o encontrou na inauguração do local. Uma grande festa. Dezenas de índios corriam ao redor do cemitério, com Robson Miguel à frente e sua esposa We e na. "O que eu puder fazer para quebrar os paradigmas contra os negros e índios, eu farei. Na Europa sou conhecido como brasileiríssimo!", resume.

"O QUE EU PUDER FAZER PARA QUEBRAR OS PARADIGMAS CONTRA OS NEGROS E ÍNDIOS, EU FAREI. NA EUROPA SOU CONHECIDO COMO BRASILEIRÍSSIMO! "

O ENIGMA DA LUZ

É tradição: todos os castelos do mundo possuem os seus segredos. O Castelo de Robson Miguel, não é diferente. Com a ajuda de pedreiros, ele construiu um orifício no cume do teto e esperou o dia e a hora de seu nascimento, para em questão de segundos, determinar com precisão a incidência da luz do sol em cima de seu ataúde. "Passamos três anos observando e demarcamos o espaço exato. Foi muito trabalhoso, mas valeu a pena. A partir daí, todos os anos - no dia e hora do meu nascimento - o sol bate no local do meu ataúde. Exatamente no instante em que a minha mãe me deu à luz. Equipes de televisão já vieram testemunhar, dando a entender que fosse uma informação falsa, mas saíram convencidos. Há seis anos, ilustres convidados são recepcionados para registrar o enigma da luz no Castelo de Robson Miguel.